segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Espiritualidade crista

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ESPIRITUALIDADE CRISTÃ

CURSO DE ESPIRITUALIDADE CRISTÃ





COLETÂNEA DE ESCRITOS DE:
Pe. Auricelio Ferreira Correia,SDN.
Pe. Frank Antonio de Almeida.
Pe. João Pereira Gomes, C. Ss. R.







A Teologia Espiritual ou Espiritualidade é uma ciência teológica muito rica, antiga no judaísmo e no cristianismo.

A Espiritualidade é um dos ramos da Teologia, como a Dogmática, a Exegese, a Moral, a Liturgia e a Pastoral. Chama-se também Teologia Espiritual, Ascética e Mística, Teologia da Perfeição Cristã, Perfeição, Contemplação.

A palavra ESPIRITUALIDADE vem de spiritus, em latim. É o ar, o vento, o sopro. É o Espírito Santo, sopro que empurra, Amor que impulsiona as pessoas. A própria palavra significa que não existe espiritualidade fora do Espírito Santo.

Na Bíblia, a figura mais usada para falar da espiritualidade é o sopro: RUAH em hebraico, PNEUMA em grego, ESPÍRITO em português. No AT aparece 378 vezes. Os livros onde é mais empregada: Ezequiel 52 vezes, Isaías 51, Salmos 39. A pomba como figura do Espírito Santo é usada na Bíblia, porém, sem a força do simbolismo do sopro.

O Espírito Santo, portanto, é a espiritualidade, é o Amor que santifica as pessoas, as comunidades, a Igreja. Se o Pai é tido como Criador, o Filho como Salvador, o Espírito Santo é o Santificador. Ser santo é viver sob o impulso do Espírito Santo; é viver na ótica do Amor. Pessoa ou comunidade que tem espiritualidade é a que tem, como referência absoluta de sua vida, o Amor; tem o Amor como critério para selecionar seus atos, escolhas e opções de vida.

Madre Paulina não ficou santa depois da morte; nem porque o papa a canonizou. Ela viveu de tal maneira que o papa declarou que essa pessoa pode ser apresentada como modelo de santidade.

Todo cristão por excelência é chamado a uma vida espiritual, a viver a sua própria santidade. A santidade é a vontade de Deus para todos os seus filhos.

O Concilio Vaticano II, reafirma que todo o ser humano é chamado a viver a santidade.



• ESPIRITUALIDADE:



• No sentido cristão, é uma forma concreta – movida pelo Espírito Santo – de viver o Evangelho de Jesus. Brota de uma experiência espiritual vivida intensamente.

• É sempre trinitária, relacionando-se com o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Ela diz respeito a uma motivação evangélica profunda e duradoura, marcando a existência pela presença do Espírito, que nos ilumina e move por dentro.

• É um caminho de fidelidade às inspirações mais essenciais do Evangelho, como Boa Nova de salvação e vida.

• É a vida de intimidade com Deus; é a sede do sobrenatural. Esta vida de intimidade com o Absoluto gera, conseqüentemente, o desapego das coisas materiais, o cultivo da vida interior pela oração e meditação da Palavra de Deus, e leva também a aspirar às coisas do alto, segundo a expressão paulina: “Se ressuscitastes com Cristo, procurai as coisas do alto”(Col 3,1).

• conjunto de princípios e praticas que caracterizam a vida de um grupo de pessoas referido ao divino, ao transcendente; à vida no Espírito – o que se faz com aquilo em que se acredita; as diferentes maneiras pelas quais se experimenta a transcendência, o modo segundo o qual a vida cristã é concebida e vivida.



* A ESPIRITUALIDADE CRISTÃ consiste na maneira de se ler, entender e viver o Evangelho, e inclui o SEGUIMENTO DE JESUS; as diferentes maneiras de experimentar e fomentar a vida em Cristo; realidade vital que se edifica sobre o dom da graça; uma crescente comunhão com Deus, na qual a força do espírito Santo conduz a uma progressiva espiritualização (compenetração do espírito de Cristo), tornando o cristão capaz de acolher e conhecer os segredos de Deus (1 Cor 2,9-14; 6,17: o Espírito que sonda as profundidades de Deus; Rm 8,14-16; Gl 4,6: espírito de filiação); é uma realidade teologal. Cada fase da vida, cada proposta, cada atitude, cada momento, cada ensinamento, cada gesto de Jesus pode gerar um tipo de espiritualidade.



• Vejamos:

a) Jesus menino (Lc 2,51-52)

b) Jesus na sua vida oculta em Nazaré (a Sagrada Família)

c) Jesus pobre e operário (Mt 13,55)

d) Jesus nas suas andanças missionárias anunciando o Reino (Lc 4,18-19; 4,43-44)

e ) Jesus retirando-se para lugares desertos, indo para os montes e procurando o silêncio das noites e das madrugadas para estar a sós com o Pai (o Jesus contemplativo):

* Lc 4,42 (de madrugada)

* Lc 5,16 (costume de Jesus)

* Lc 6,12 (noite inteira)

* Lc 9,28 (monte Tabor)

* Jo 6,15 (retirou-se para o monte – rezar)

f) Jesus misericordioso (Mt 9,13)

g) Jesus e Maria.

Lendo os evangelhos, descobriremos tanta coisa maravilhosa da vida de Jesus que, por si, pode tornar-se fonte de inspiração para novos modelos de espiritualidade.

Espiritualidade é Amor. Amor de Deus, porque é nosso Pai; Amor ao próximo, porque é nosso irmão. No caso dos irmãos, o Amor é preferencialmente aos pobres e excluídos. A espiritualidade integra dois outros à nossa vida: o Pai e o irmão, pelo Amor. As diversas espiritualidades têm essa base comum. O que as diferencia é a maneira de viverem a prática de Amor. Porque a espiritualidade não é alienada. A espiritualidade é tão criativa que não só renova, mas transforma as pessoas e as comunidades.

O modelo acabado da espiritualidade é Jesus Cristo na cena magistral do lava-pés. Em Jesus Cristo, o Amor é serviço ao Pai em favor dos irmãos.



A ESPIRITUALIDADE DE JESUS é o modelo. Está codificada nos Evangelhos. Os apóstolos a viveram ao seu lado. Os pilares da espiritualidade de Jesus são:

1. Sua intimidade com o Pai

2. Sua fidelidade absoluta ao Projeto do Pai

3. Seu amor extremado aos homens, ao ponto de doar a sua vida e o seu próprio sangue para remi-los (Jo 15,13).

Ninguém consegue viver todos os valores do Evangelho, ou todas as propostas de Jesus. Mas, de acordo com o “sopro do Espírito Santo”, podemos radicalizar alguns valores evangélicos e propostas de Jesus. É o que constitui a ESPIRITUALIDADE. Daí, surgiram na Igreja, desde os primeiros séculos, as chamadas ESCOLAS DE ESPIRITUALIDADE.



Ascese: askesis = exercício, treino; esforços graças aos quais se procura progredir na vida moral e religiosa; em geral comporta exercícios de oração mental e uma disciplina corporal.

Mística: mystikós = que foi iniciado nos mistérios (realidade secreta, escondida ao conhecimento ordinário); realidade escondida que se propõe a um tipo de experiência que conduz à união com o absoluto. Alguns autores sugerem que os termos espiritualidade e mística são apenas maneiras diversas de se referir à relação pessoal com Deus, enquanto outros admitem que a mística seja um tipo de espiritualidade que enfatiza a experiência pessoal direta de Deus.

Experiência mística: iniciativa de Deus que se faz com a pessoa participe de seu próprio mistério, embora na obscuridade de um conhecimento inadequado à sua transcendência; estado da vida em que Deus se manifesta à pessoa de modo sensível – a intensidade do sentimento da presença de Deus é tão clara, que o místico tem totalmente a certeza de que Deus está nele.



MÁRTIRES E MONGES



Entre os anos 64 e 313 a Igreja cristã no Império Romano sofre vários períodos de PERSEGUIÇÃO. É a época dos MÁRTIRES, isto é, das grandes testemunhas da fé, que deram sua vida por amor a Jesus Cristo e sua causa, imitando-o na sua Paixão e Morte.

Pelo martírio o fiel atinge a perfeição da vida cristã, exatamente porque dá prova de suprema caridade. É um “segundo batismo”, pelo fato de ser uma plena incorporação no mistério salvífico do Senhor.

As primeiras comunidade cristãs tinham um grande respeito pelos mártires, venerando-os como exemplos de vida evangélica, como mostram vários documentos da época.

Os mártires são os primeiros santos com culto público. A Igreja festejava seu “dia natalício” = seu passamento ao céu! A eucaristia é diretamente relacionada com o martírio: celebrava-se a Missa sobre as relíquias dos mártires!

O martírio sempre constituiu uma fonte de grande fecundidade espiritual e apostólica e nunca perde sua atualidade na Igreja.

Quando a Igreja adquiriu sua liberdade, em 313, alguns cristãos começam a questionar a subseqüente acomodação do cristianismo, religião agora beneficiada com muitos favores por parte da autoridade pública. Eles contestam essa evolução, considerando-a como uma traição da autenticidade evangélica. Retiram-se desta sociedade (“fuga mundi”), indo em direção ao deserto (Egito). Nasce assim a VIDA RELIGIOSA na sua forma anacorética (eremítica ou solitária).

A figura de maior destaque entre os antigos anacoretas é Santo Antão (+356, com 105 anos de idade).

Esses monges (solitários), no entanto, tornaram-se focos de irradiação de vida cristã, transmitindo a outros (discípulos) sua experiência espiritual (aconselhamentos).

No decorrer dos anos surgirão verdadeiras comunidades de monges (mosteiros), sob a direção de um “pai espiritual” (Abade), sendo São Pacômio (+346) um dos mais conhecidos no início do monaquismo (cenobítico = em comunidade)

Com São Basílio (+379), o monaquismo do Oriente recebe maior estruturação e organização. São Bento de Núrsia (+547) adapta o monaquismo à realidade Ocidental, iniciando importantes experiências monásticas no centro da atual Itália, que terão um grandioso futuro. Famosa é a Regra que escreveu para seus seguidores (Beneditinos)



I – A IDADE PATRÍSTICA



PATRÍSTICA é o período que vai do findar do primeiro século até aos inícios da Idade Média (450-600). É a idade em que se elaboraram os conteúdos (as contribuições) que constituiram a “Ciência da Espritualidade”. Esta “Ciência” teve os “Mestres” do Oriente, representados por São João Clímaco, e os do Ocidente, representados por Cassiano. Foram os dois eminentes sintetizadores.

Os “teólogos”, homens ilustres, sábios e santos desse período, passaram à História da Igreja com o nome de SANTOS PADRES. Eram profundos conhecedores da Sagrada Escritura, da vida espiritual e do que era conhecido, ensinado e vivido pela Igreja de então



CARACTERÍSTICA DOS SANTOS PADRES:



* ortodoxia da doutrina

* santidade de vida

* reconhecimento por parte da Igreja

* antigüidade (450 – 600)



- PATROLOGIA é o estudo da PATRÍSTICA

- Principais expoentes dos três primeiros séculos:

- São Clemente de Roma escreveu uma célebre Carta à Igreja de Corinto recomendando a concórdia, a humildade e a obediência.

- Hermas (cognominado de “Pastor de Hermas”), expõe por extenso as condições da volta a Deus pela penitência.

- São Clemente de Alexandria descreve como pela ascese o verdadeiro gnóstico chega à contemplação.

- São Cipriano (África) – seus escritos são mais de ordem pastoral.



DO SÉCULO IV AO VII



NA IGREJA DO OCIDENTE



– Santo Ambrósio(333-397) – Bispo de Milão – Instruiu Santo Agostinho na fé;

– Santo Agostinho(354-430) – foi bispo de Hipona(África) – herdou do pai o temperamento sensual e impetuoso, e da mãe a ternura e a tendência para a contemplação mística.

– Cassiano(360-435) – deixou uma rica contribuição sobre a espiritualidade monacal, aproveitada pelos grandes mestres.

– São Bento(480-543 Subiaco
Itália) – É muito lido, valorizado e apreciado o seu livro: Regula, escrito para a formação de seus monges.

– São Gregório Magno(540-604) – Foi Papa de 590 a 604. Deve-se-lhe a liturgia da missa e o rito gregoriano. Valorizou grandemente o canto na Igreja, estabelecendo critérios para a sua “beleza e espiritualidade”.



NA IGREJA DO ORIENTE



– Santo Atanásio (297-373) – Patriarca de Alexandria (Egito). Lutou com firmeza contra os Arianos.

– São Cirilo de Jerusalém (315 - 386) – Em suas “CATEQUESES” traça o perfil do verdadeiro cristão. Ele foi, antes de tudo, um pastor – mestre – catequista.

– São Basílio (330-379) – um dos fundadores do monaquismo.

– São João Crisóstomo(344-407) – Natural de Constantinopla. Foi um ardoroso pastor de alma e um grande orador. Suas célebres HOMILIAS formam um repertório completo de moral e ascética.

– São Cirilo de Alexandria (+444) – Deixou uma valiosa obra: THESAURUS DE SANCTA ET CONSUBSTANTIALI TRINITATE, onde ele versa sobre a intimidade da alma com a Santíssima Trindade.

– São João Clímaco (+649) – É de sua autoria: SCALA PARADISI (A Escada que conduz ao Céu – “A Escada do Paraíso”. É um resumo de ascética e mística para os monges do Oriente, análogo ao de Cassiano para os do Ocidente.



II – IDADE MÉDIA



Os Mestres da Idade Média elaboraram e sintetizaram os elementos da ESPIRITUALIDADE DOS SANTOS PADRES. Respigaram, comentaram e apresentaram.





Escola beneditina



1. ESCOLA BENEDITINA



a) Santo Anselmo (1033-1109): na Abadia de Bec (Normandia – França), cujas MEDITAÇÕES e ORAÇÕES estão cheias de piedade juntamente dogmática e afetiva. No seu livro CUR DEUS HOMO, encontram-se sólidas considerações sobre a ofensa infinita feita a Deus pelo pecado e sobre a virtude das satisfações de Cristo.

b) São Bernardo (1090-1153): Na Abadia de Cister(França), cuja piedade afetiva e prática exerceu imensa influência sobre toda a Idade Média. São Bernardo foi um grande devoto, estudioso e arauto de Maria. Seu amor à Vida Religiosa foi tamanho que levou centenas de jovens a abraçarem a Vida Monástica cisterciense.Deixou um grande número de obras.



1.1. ESCOLA DE SÃO VITOR



 Hugo(+ 1141) – Abade de Cluny – França Escreveu: De Sacramentis Christiane Fidei; De Vanitate; De Modo Orandi; De Meditando e outros.

 Ricardo(+ 1173) – Entre os seus escritos estão: Beniamin Minor (preparação para a contemplação); Expositio in Cantica Canticorum, etc.



AS ORDENS MENDICANTES



OS MENDICANTES: São Francisco de Assis(+1226) e São Domingos de Gusmão(+1220)



A passagem do século XII para XIII é marcada por uma profunda mudança no campo econômico e social. Com o crescimento do comércio (após as Cruzadas) surgem, por toda parte, cidades (“burgos”) cuja população (“os burgueses”) contesta o antigo regime feudal com sua semi-escravidão. Também a Igreja enfrenta grandes desafios. “Liberdade” é a profunda aspiração dos habitantes desses novos centros urbanos. Neste contexto vemos aparecer grupos de cristãos que querem viver o Evangelho de modo mais radical, imitando a vida de Jesus e dos apóstolos (“vida apostólica”. Pobreza e simplicidade são suas notas características.



2. ESCOLA FRANCISCANA



O que a caracteriza é ser especulativa e afetiva. Parte do amor a Jesus crucificado, para fazer amar e praticar alegremente as “virtudes crucificantes” e sobretudo a pobreza. É por isso que se tornou comum chamar de “pobreza franciscana” a vida vivida na extrema simplicidade e privação dos bens materiais

a) São Francisco de Assis(1181-1226 Itália). Ele é, pela sua vida e ensinamentos, o criador dessa escola. Não resta dúvida, a designação veio depois de sua morte.

b) São Boaventura,OFM(1221-1274 Itália). Além de suas obras teológicas, compôs muitos tratados ascéticos e místicos.

c) Santa Catarina de Bolonha(1413-1463). Ensina, as SETE ARMAS ESPIRITUAIS CONTRA OS INIMIGOS DA ALMA, meios muito práticos para vencer as tentações.



3. ESCOLA DOMINICANA



A Espiritualidade dessa Escola é baseada na Teologia Dogmática e Moral, que faz corpo com ela e concilia a oração litúrgica e contemplação com a ação e o apostolado.



• São Domingos de Gusmão (1170-1221 Espanha). Fundador da Ordem dos Pregadores, ou seja, Dominicanos. Elaborou suas CONSTITUIÇÕES segundo as dos Premonstratenses, com o intuito de formar pregadores sábios e santos capazes de defender a religião contra os mais doutos adversários.

• Santo Alberto Magno (1206-1280 Alemanha). Era Dominicano e foi professor de Santo Tomás de Aquino.

• Santo Tomás de Aquino (viveu entre 1225 e 1274): “Doctor Angelicus” (o Doutor Angélico). É considerado, ao lado de Aristóteles, Cícero e Santo Agostinho uma das maiores inteligências de mundo. Versou excelentemente sobre todas as questões importantes da Ascética e Mística nas suas diversas obras, mormente na SUMMA THEOLÓGICA. É um dos teólogos e filósofos cristãos que legou à humanidade um grande número de obras.



4. ESCOLA FLAMENGA



Sua maior característica é sua orientação mística.



a) B. João Ruysbroeck(1293-1381) – Foi o iniciador dessa escola. Sua terra são chamados Países Baixos. Deixou várias obras escritas.

b) Tomás a Kempis ou de Kempis (1380-1471). Nasceu em Colônia\Alemanha e morreu no Mosteiro de Sant’Ana, perto de Zwolle (Países Baixos\Holanda). Era da Ordem dos Cônegos Regulares de Santo Agostinho. É o representante mais conhecido, lido e apreciado da Escola Flamenga. É o autor de diversos opúsculos de cunho ascético e místico, entre outros está o DE IMITATIONE CHRISTI, sua obra prima por excelência. A IMITAÇÃO DE CRISTO, como se diz “é o livro mais belo que saiu da mão de um homem, pois o Evangelho não é obra humana”. No Concílio de Trento, esse livro maravilhoso foi entronizado na Aula Conciliar ao lado do Livro dos Evangelhos. A IMITAÇÃO DE CRISTO revela que seu autor percorreu as vias da mais alta espiritualidade e mística em profundas e longas meditações, por longos anos, antes de passar para o papel as suas experiências místicas.



5. ESCOLA CARTUSIANA



Cartusiano(a) – vem de “CARTUXA”, através do latim “CARTUSIA”. É a Ordem Religiosa mais rigorosa da Igreja. Foi fundada por São Bruno (1033 – 1101), na França. A espiritualidade dessa Escola baseia-se no “Solus cum Solo” – solidão, silêncio, oração, contemplação, ascética e penitência.

a) Hugo de Balma (ou de Palma). Viveu na segunda metade do século XIII. É atribuída a ele a obra Theologia Mystica. Um considerável tratado de espiritualidade ascética e mística.

b) Ludolfo da Saxônia (ou Ludolfo o Cartusiano). Viveu entre 1300 e 1370. Legou à posteridade VIDA DE NOSSO SENHOR, que teve extraordinária influência sobre a piedade cristã. É mais de meditação do que livro histórico, enriquecido de piedosas reflexões tiradas dos Santos Padres.

c) Dionísio Cartusiano (1402-1471). Produziu várias obras.

d) Molina Cartusiano (1560-1612 Espanha). Compôs Ejercicios Espirituales, em que trata da excelência e da necessidade da oração mental (a meditação).



III - IDADE MODERNA (RENASCENÇA)



CONCÍLIO DE TRENTO



Antes de entrar nas novas Escolas de Espiritualidade, vem a propósito conhecer um pouco desse Concílio. Ele mudou a direção da caminhada da Igreja, levando-a a uma ampla revisão e afervoramento na vida eclesial. Deu um impulso forte à vida cristã, forneceu novo elementos para a reflexão e a espiritualidade, afervorou todos os segmentos eclesiásticos (bispos, padres, religiosos e leigos), definiu muita coisa indefinida e imprecisa, sobretudo no campo da Teologia Dogmática e Moral e reformou a disciplina eclesiástica que estava uma calamidade

O nome deste Concílio vem da cidade de Trento\Itália, onde foi realizado. Muita gente, mal informada, refere-se a esse Concílio, com ares de deboche, como retrógrado e uma simples reação contra a onda protestante que quebrava a unidade da Igreja. Uns historiadores chamam-no de “Contra-Reforma”. Não é um termo feliz e adequado, porque o Concílio de Trento, bem antes do movimento liderado por Lutero e seus companheiros, já tinha sido pensado por alguns papas e bispos para extirpar certos abusos na vida da Igreja e revitalizá-la. Não foi, portanto, convocado apenas para fazer frente às idéias de Lutero. Não resta dúvida de que o surgimento da denominada Reforma tenha agilizado a sua convocação.

Loão X (1513-1521) andava muito angustiado com a situação de relaxamento generalizado na Igreja e com o movimento protestante que estava dilacerando a sua “túnica inconsútil”(Jo 19,23). Lançou, então, sua clamorosa encíclica “Exsurge, Domine et salvam fac vineam tuam” (Levanta-te, Senhor, e salva a tua vinha – Igreja).

O seu clamor diante da decadência da Igreja, “santa e pecadora”, retrata bem as lamentações de Jeremias. Era mesmo preciso reformar a Igreja, baseado no princípio: “deformata reformare; reformata consolidare; consolidata confirmare” (Reformar o que está deformado; consolidar o que foi reformado; confirmar o que foi consolidado).

A crise chegou ao auge no pontificado de Paulo III (1534-1549). Não era mais possível ir adiando a convocação de um Concílio. Os seus três últimos predecessores (Leão X, Adriano VI e Clemente VII) passaram também num Concílio, mas não conseguiram convocá-lo. Porém, Paulo III, ouvindo os anseios de toda a Igreja, decidiu convocá-lo. Foi aberto aos 13 de março de 1545 e encerrado aos 03 de dezembro de 1563. Teve portanto a duração de 18 anos.

O Concílio de Trento foi, primordialmente, Doutrinário, Disciplinário e Litúrgico. Mas a reforma da Igreja teria que começar pela cabeça: Papa, Cardeais e Bispos para atingir os membros. Era o pensamento de todos.

O Arcebispo de Braga(Portugal), Dom Frei Bartolomeu dos Mártires, numa atitude corajosa e profética, ergueu a voz em uma solene sessão conciliar inicial e disse com destemor: “Os eminentíssimos e reverendíssimos cardeais é que precisam de uma eminentíssima e reverendíssima reforma”.

A máquina da Igreja tinha desencarrilhado. E como colocá-la nos trilhos sem uma reforma drástica na vida dos dignitários da Igreja!



Não se discute que os Padres Conciliares tridentinos tomaram uma posição definida e clara diante do Protestantismo que se alastrava, e propuseram, também de maneira clara e definida a doutrina católica sobre três pontos básicos e essenciais:

a) A ESCRITURA, condenando o “livre exame protestante;

b) O papel da fé e das obras;

c) Os Sacramentos.



Na parte disciplinar:



a) Foram estabelecidas exigências para a ordenação de padres e bispos;

b) Acabou com os “Padres e Monges vagos” e com os Bispos não residenciais;

c) Simplificação dos palácios episcopais e a vida dos Bispos (que deviam ser pastores e não príncipes da Igreja);

d) Obrigação da “Visita ad limina” de 5 em 5 anos para os Bispos com uma programação especial prescrita;

e) Criação dos Seminários;

f) Normas para a fundação de novas famílias religiosas. Não seria mais permitido a fundação de novas Ordens. As novas fundações seriam de Congregações ou Institutos Religiosos. Fazendo a transição, apenas os Jesuítas é que foram fundados como “Companhia”.



Na parte litúrgica:



Rito e modo de celebrar a missa (Missa Tridentina) e administrar os sacramentos.

Segundo os historiadores de maior respeito, o Concílio de Trento foi um dos mais importantes e marcantes da Igreja. O afervoramento eclesial perpassou por toda parte, atingindo a vida dos eclesiásticos, dos mosteiros (da Vida Religiosa) e do povo cristão.

Depois desse Concílio, começaram a surgir novas Escolas de Espiritualidade na Igreja.

Mas, principalmente, as três Escolas antigas continuam a influenciar: a Beneditina, a Dominicana e a Franciscana.



a) a Escola Beneditina conserva suas tradições de piedade afetiva e litúrgica;

b) a Escola Dominicana muito ligada à doutrina de Sto. Tomás de Aquino, explica e sintetiza com clareza e método o seu ensino sobre a ascese e a contemplação;

c) a Escola Franciscana conserva o seu caráter de simplicidade evangélica, de pobreza alegremente vivida, de afetuosa devoção a Jesus Menino e a Jesus Crucificado.



Escola inaciana



6. ESCOLA INACIANA



As Escolas antigas continuam a dar maior precisão à sua doutrina. Surgiram outras novas com um grande dinamismo espiritual, sob o influxo do Concílio de Trento e da Reforma Católica.

A Escola Inaciana é de Espiritualidade ativa, enérgica e prática, que tende a formar a vontade em ordem à santificação pessoal e ao apostolado.

O iniciador dessa Escola é Santo Inácio de Loyola(*1491 e + 1556). Foi o fundador da Companhia de Jesus (os Jesuítas). Entre o que ele deixou escrito, merecem um destaque especial: “os Exercícios Espirituais”, em que o santo expõe o método de trabalho para reformar e transformar uma alma, conformando-a com o divino modelo, Jesus Cristo, “o obediente do Pai”.

Entre outros expoentes da Escola Inaciana, estão:

1) Suarez (1548-1617 Espanha): o seu livro DE RELIGIONE é um tratado completo de espiritualidade, acentuando o valor e a necessidade da oração para a santificação, os votos religiosos e à obediência às regras.

2) S. Roberto Belarmino(1542-1621 Itália): deixou várias obras de grande contribuição para a espiritualidade.

3) Afonso Rodriguez(+ 1616 Espanha): a sua obra em três volumes: Exercícios de perfeição e virtudes cristãs é de um valor extraordinário.



Escola carmelitana



7. ESCOLA TERESIANA ou CARMELITANA



A característica dessa Escola é: “o tudo de Deus e o nada da criatura”, ensinando o desprendimento das coisas terrenas para chegar à contemplação e à prática do apostolado pela oração, o exemplo (o testemunho de vida) e o sacrifício.

Os representantes máximos dessa Escola são:

1) Sta. Teresa de Ávila(1515-1582 Espanha). Modelo e Doutora da Igreja. Atingiu as raias da mais alta vida espiritual. Suas obras nos convidam a ser inteiramente de Deus, e nos falam de suas experiências místicas, como: LIVRO DA VIDA, AS FUNDAÇÕES, CASTELO INTERIOR OU MORADAS e outros. Respaldada pelo Concílio de Trento e ao lado de S. João da Cruz, reformou os Carmelos de sua época. Exerceu uma grande influência sobre a espiritualidade carmelitana.

2) São João da Cruz(1543-1591): Discípulo de Sta. Teresa de Ávila. Doutor da Igreja e Príncipe dos poetas espanhóis. Suas obras formam um tratado completo de ascética e mística

3) Santa Teresinha do Menino Jesus(1873-1897 Alençon
França). Dentro da Escola Teresiana, Sta. Teresinha criou a “Infância Espiritual”. O Menino Jesus motivou toda a sua espiritualidade. A sua autobiografia “Histoire d’une âme” tem feito um bem imenso a todos que a lerem.

4) Elizabeth da Trindade(1880-1906 França). Uma grande contemplativa. Seu livro mais conhecido e lido é Souvenirs.



8. ESCOLA SALESIANA



Essa Escola mostra que a santidade não é privilégio de quem abraça a Vida Religiosa ou Sacerdotal, consagrando-se a Deus pelos votos. Em todo e qualquer estado de vida no mundo, pode-se atingir a santidade. Os simples leigos, casados ou solteiros, podem ser santos e merecer as honras dos altares. Quando Jesus disse: “Portanto, sede perfeitos (santos) assim como vosso Pai celeste é perfeito” (Mt 5,48), Ele se referia a todos sem exceção e discriminação. O convite universal à santidade foi muito bem focalizado pelo Concílio Vaticano II (LG Cap. V).

1) São Francisco de Sales (1567-1622) Era suíço e Bispo de Genebra. Foi o iniciador dessa nova Escola que produziu muitos santos e levou muita gente para o céu. Teve o grande mérito de mostrar que a santidade é para todo cristão e não existe, no nosso linguajar de hoje, supercristão. Todos nós somos filhos do mesmo Pai que não privilegia a nenhuma classe de pessoas.

2) Santa Joana de Chantal Foi co-Fundadora (com S. Francisco de Sales) da Congregação Filhas da Visitação. Sua vida e suas obras retratam bem a espiritualidade da Escola Salesiana. São João Bosco, ao fundar os Salesianos, bem mais tarde, adotou a espiritualidade “Salesiana”, daí o seu nome.



ESCOLA FRANCESA DO SÉCULO XVII



A sua espiritualidade dimana dos dogmas da fé e do dogma da Encarnação do Verbo. Incorporados em Cristo pelo Batismo, e recebendo por conseguinte o Espírito Santo, que vem habitar em nós, devemos em união com o Verbo Encarnado, glorificar a Deus, que vive em nós, e reproduzir as virtudes de Jesus, combatendo vigorosamente as tendências contrárias da carne ou do homem velho.

Maria ocupa um lugar importante nessa Escola, cujo fundador foi o Cardeal De Bérulle. Há uma plêiade de homens santos que se santificaram consoante os moldes espirituais dessa Escola. Entre esses “santos ilustres”, estão S. Vicente de Paulo, Olier, São Sulpício, S. João Eudes, S. Luiz Grignion de Montfort, S. João Batista de la Salle, e outros.

a) Card. De Bérulle (1575-1629). Fundador do Oratório de França. Não é canonizado, mas foi um homem de peregrinas virtudes.

b) São Vicente de Paulo (1576-1660 Paris). Foi realmente o “pai dos pobres e abandonados”. Discípulo fiel do Card. De Bérulle. Foi o Fundador dos Padres da Missão e das Filhas da Caridade (as Irmãs Vicentinas).

c) J.J.Olier (1608-1657). Fundador da Companhia de S. Sulpício. Ele apresenta-nos a doutrina comum de toda a Escola Francesa. Quem lê Olier, tem uma visão clara e global de toda essa Escola. Além de numerosos manuscritos, deixou-nos Catéchisme Chrétien pour la vie intérieure, em que mostra como, pela prática das virtudes cruciantes, se chega à união íntima e habitual em Jesus Cristo; Introduction à la vie et aux vertues chrétiennes; journée chrétienne; traité des saints ordres para preparar o clérigo para ser o “religioso de Deus” pela sua transformação em Jesus, Sumo Sacerdote e Vítima; as suas Cartas completam o que ele expõe em seus livros.

Obs.: O Seminário de “São Sulpício”, em Paris, tornou-se um centro de espiritualidade, uma verdadeira escola de oração. Formou um grande número de sacerdotes santos e zelosos: S. João Eudes (1601-1680), S. Luiz-Maria Grignion de Montfort (1673-1716), S. João Batista de la Salle (1651-1719).



A Escola Francesa se notabilizou pelas suas orientações e ensinamentos. Teve ampla aceitação em toda a Igreja, máxime nos Seminários e Conventos.

Em conseqüência da Encarnação do Verbo, Maria ocupa um lugar privilegiado ao lado de Jesus. Todos os Mestres dessa Escola e seus seguidores aprofundaram muito o estudo da Teologia Mariana, tornaram-se grandes devotos de Nossa Senhora e difusores de seu culto.

Montfort, entre eles, foi um apaixonado da Mãe de Jesus. Enriqueceu grandemente a Mariologia com suas obras. A devoção a Maria, por ele proposta, é baseada na mais sólida Teologia católica, na Patrística e na Bíblia. Propõe, como prática da lídima devoção mariana, a Santa Escravidão à Santíssima Virgem. Um sem número de eclesiásticos, religiosos e leigos se fizeram escravos de Nossa Senhora segundo a doutrina montfortiana. No seu livrinho de ouro “tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem”, expõe toda esta sua doutrina.

O Pe. Júlio Maria de Lombaerde, fundador dos Missionários Sacramentinos de Nossa Senhora, foi um discípulo fiel, fervoroso e entusiasta da Escola Francesa e seguiu as pegadas de Montfort, que marcou profundamente a sua espiritualidade. Ele uniu a sua devoção à Sma. Virgem à Eucaristia, dentro dos princípios dessa Escola.



9. ESCOLA LIGORIANA



Esta Escola distingue-se pela sua piedade simples, afetiva e prática. Basei-se no amor de Deus e do Redentor, e recomenda, como meios para alcançar esse fim, a ORAÇÃO e a MORTIFICAÇÃO.

Sto. Afonso de Liguori (1696-1787), que dá o nome a esta Escola, é um dos escritores mais fecundos. Além de suas obras de Dogma e Moral, escreveu tratados ascéticos sobre quase todos os assuntos. Por exemplo: As Máximas Eternas; A Via da Salvação; Prática do Amor a Jesus Cristo; Reflexões Sobre a Paixão; Glórias de Maria; Visitas ao Smo. Sacramento; Maneira de Conversar Familiarmente com Deus e O Grande Meio da Oração. Para a Vida Religiosa: A Verdadeira Esposa de Cristo ou o Religioso Santificado.



10. ESCOLA JANSENISTA



O nome dessa Escola vem de Cornélio Jansênio (1585-1638), teólogo holandês e bispo de Ypres(Bélgica). Escreveu o livro AUGUSTINUS, em que expõe, de seu ponto de vista, a doutrina de Sto. Agostinho sobre a graça, livre arbítrio e predestinação. Suas doutrinas foram condenadas por Urbano III (1623-1644). Atualmente, o Jansenismo perdura e tem sua sede em Utrecht (Holanda).

É a espiritualidade que leva ao rigorismo moral, provocando um arrependimento doentio do pecado e uma piedade sentimentalista. Focaliza a gravidade e enormidade do pecado. As passagens bíblicas da preferência dos mestres do Jansenismo eram, por exemplo: Jesus com o chicote na mão (Mt 21,12-13).



NOSSA ESPIRITUALIDADE É CRISTÃ



À luz da fé cristã nós descobrimos a presença de Deus no cosmo, na vida humana e na história com amor gratuito e salvação precisamente porque Jesus, Filho de Deus e filho de Maria de Nazaré, com sua palavra, atividade, morte e ressurreição, nos faz entrar vitalmente nessa descoberta. A partir desse encontro de fé, nossa espiritualidade só pode ser “religiosa” (como voltada para o Deus vivo, revelado por Jesus) e “cristã” mesmo (como seguimento de próprio Jesus).

O Deus de Jesus é o nosso Deus. Ele é a profundidade máxima de nossa vida.

A causa de Jesus é a nossa causa.

Nosso viver é o Cristo (Fl 1,21). Ele é nossa paixão e seu Espírito é nossa espiritualidade.

Nossa espiritualidade é nossa em dois sentidos:

1. Porque é uma espiritualidade personalizada, que nós vivemos consciente e livremente, na condição de pessoas adultas também na fé.

2. Abrange todas as dimensões de meu ser (alma e corpo, pensamento e vontade, sexo e fantasia, palavra e ação, interioridade e comunicação, contemplação e luta, gratuidade e compromisso).

é tão clara, que o místico tem totalmente a certeza de que Deusestá nele.



Espiritualidade cristã indica Fé e Vida:

“A fé é a garantia dos bens que se esperam,a provadas realidades que não se vêem.”Hb11,1

Nosso estudo da teologia tem mostrado o processo de elaboração teológico e sua importância para a vida dos crentes, sempre tendo em vista que fazer teologia não é um mero ato especulativo, onde o cientista da teologia se coloca diante do seu objeto com o objetivo de esmiuçá-lo, sem relação nenhuma com ele.

A teologia tem, com efeito,uma projeção sobre a vida do teólogo,enquanto contribui para uma aproximação ao Mistério Divino e uma configuração a Cristo Senhor e Salvador, desembocando numa pratica de vida coerente com aquilo que se crê e se celebra. Contudo, a teologia é possível por causa da fé.

A fé é ato humano, realizado dentro da liberdade humana, porém não se pode dizer “eu creio” sem que o objeto crido se manifeste ao crente, ou seja, nós temos fé porque Deus mesmo se revelou e mostrou a nós sua vontade. Não se tem fé somente baseado no desejo humano de crer de num ser superior a quem se dá o nome de Deus, mas a fé é Graça de Deus. Isso não significa que a fé contraria a razão e a liberdade humanas, porém “na fé, a inteligência e a vontade humanas cooperam com a Graça divina.” Portanto, “crer é um ato da inteligência que assente à verdade divina a mando da vontade movida por Deus através da Graça.”

O teólogo protestante Karl Barth define assim a fé cristã:

“A fé cristã é o dom do encontro que torna os homens livres para escutar a Palavra da graça, pronunciada por Deus em Jesus Cristo, de maneira tal que eles se atêm às promessas a aos mandamentos dessa Palavra, apesar de tudo de uma vez por todas, exclusiva e totalmente.”

A fé é “Dom” “Graça”, ou seja, é a capacidade dada por Deus para que os homens creiam nele. Podemos ver isso no episódio em que Pedro professa sua fé em Jesus, afirmando que ele é “o Cristo,o Filho do Deus vivo”.Jesus diz a Pedro que ele é “Bem-aventurado”,pois não foi a carne nem o sangue que o revelou esta verdade, ou seja, não foi pelo esforço de Pedro que ele chegou a essa conclusão, nem porque recebeu de outrem esse ensinamento, mas foi o Pai que revelou a ele.

Ao se tratar de fé, não podemos nivelá-la às outras formas de conhecimento, pois ela não parte de nenhuma constatação empírica,ou seja,não se prova a fé como se prova que a Terra gira em torno do sol, nem tampouco se pode afirmar que se chegou a fé a partir de um esforço intelectual. A sabedoria da fé consiste em abandonar-se confiantemente a Deus, apoiando-se em sua Palavra, como palavra para mim. “Não se crê ‘por causa de’ ou ‘baseado em’, mas se é despertado para a fé a despeito de tudo.”

Sabemos que a fé é um ato pessoal e que ninguém poderá professá-la por mim, pois é uma resposta livre do homem à Revelação de Deus. Cada um professa pessoalmente sua fé, porém, não se pode entender a fé como um ato isolado, solitário. Assim, ninguém crê sozinho, até porque, a fé não brota do nada, mas da escuta da Palavra proclamada, ou seja, alguém anunciou para mim a Palavra e eu então livremente professo a fé nesta Palavra. Nesse sentido, ninguém da a fé a si mesmo, mas depende de alguém que creu e que anunciou.



Elementos fundamentais da espiritualidade



a) Jesus Cristo morto e ressuscitado: A fonte original e fundamental da espiritualidade é Jesus cristo. Dele nascem outras fontes: a vida, a Palavra, a Eucaristia e a missão. Jesus Cristo é a plenitude da revelação de Deus (Hb 1, 1-3). O discipulado e o seguimento de Jesus são as dimensões mais importantes da espiritualidade cristã.

O ponto de partida da espiritualidade cristã é o encontro com a pessoa de Jesus cristo. Ele é o caminho, a verdade e a vida (Jo 14,6). Por isso, toda espiritualidade fundamenta-se na opção e na pratica de Jesus. Assim alicerçada no Cristo ressuscitado, a vida do cristão faz dele uma nova criatura de ser sinal visível do amor de Deus no mundo. Somos transformados de tal maneira que, apesar das dificuldades e dos problemas que possamos carregar em nossa historia de vida, passamos a ver o mundo e as pessoas com olhos de Deus, isto é, com ternura, bondade, gratidão, compaixão e misericórdia.



b) A Palavra de Deus: O cristão deve amar a Palavra de Deus. A Bíblia é o espelho no qual vemos nossa vida e a vida de todas as pessoas confiadas a nós por meio do batismo. A Bíblia tem de fazer parte da espiritualidade do cristão. É a principal fonte de espiritualidade. É com o recurso á Palavra de Deus que o cristão vai orientar sua vida e a vida dos irmãos.

c) A Eucaristia: A Eucaristia é a fonte e o cume de toda a vida cristã. Do mistério pascal de Cristo nasce a Igreja. Por isso mesmo ela é o sacramento por excelência do mistério pascal. Está colocada no centro da vida da Igreja. Comer e beber da ceia eucarística em memória de Jesus sempre foi um ato de compromisso com a pessoa e a proposta dEle. Na Eucaristia, assumimos Deus em nossa vida, assim como o projeto de Deus como Igreja-comunidade. Comendo e bebendo o corpo e o sangue do Senhor tornamo-nos hóstias vivas na construção de um mundo mais humano, solidário e fraterno.



d) A oração: A oração é indispensável na vida do cristão. Ela é como a respiração de nossa fé: sem a oração somos como um motor sem combustível ou uma planta sem água. De acordo com o catecismo da Igreja Católica, a oração é a vida do coração novo, e ela deve nos animar a cada momento.

O Senhor conduz cada pessoa pelos caminhos e das maneiras que a Ele agradam. Cada fiel responde ao Senhor segundo a determinação de seu coração e as expressões pessoais de sua oração.

A tradição conservou três expressões principais da vida de oração: a vocal, a meditação e a contemplação. A oração vocal é aquela em que são pronunciadas verbalmente algumas fórmulas já estabelecidas pelas Igreja, por exemplo a oração que o próprio Jesus nos ensinou, o Pai nosso, ou ainda outras rezadas espontaneamente. A meditação consiste na busca orante em que se põe em ação o pensamento, a imaginação, a emoção e o desejo. Meditar é dialogar, falar com Deus e deixar que Ele fale também. Deus fala no silêncio, e no silêncio escutamos a sua voz. A contemplação se realiza pela escuta sincera e fiel à palavra de Deus e ao próprio Deus. Contemplar é olhar à Palavra de Deus e ao próprio Deus. Contemplar é olhar fixamente para Jesus. “Eu olho para Ele e Ele olha para mim”, disse certa vez a São João Maria Vianney um camponês em oração diante do Santíssimo. A contemplação não é fruto do esforço humano, mas um dom de Deus a cada um de nós. A contemplação nos envolve por inteiro e leva a transformação de nossas vidas. na contemplação percebemos a presença de Deus dentro de nós.

e) A cruz: A cruz é o sinal de nossa pertença a Cristo. É o selo por nós recebido no dia do batismo. Instrumento de vergonha, desespero e loucura para os judeus (1 Cor 1,18-23), de estupidez para os gregos, a cruz tornou-se para nós cristãos gloriosa e triunfante. A cruz é o sinal do Cristão.



Compreendemos também a cruz como as dificuldades, os conflitos e os sofrimentos de todo ser humano. “Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e me siga” (Mt 16, 24).

f) A conversão: O pecado está presente na vida dos seres humanos desde o início da humanidade. Os profetas foram os instrumentos de deus para seu povo se corrigisse e mudasse de vida. Jesus se apresenta como aquele que liberta a humanidade da escravidão do pecado (Mc 2,1-12; Lc 19,1-10; Jo 8,3-11).

A conversão e a mudança de vida são realidades que fazem parte da vida espiritual do cristão. São Paulo exorta: “reconciliai-vos com Deus” (2 Cor 5,20). O sacramento da Reconciliação é a expressão do amor misericordioso de Deus que nos reconcilia com Ele e nos faz reconciliar-nos com os irmãos. Chama-se também sacramento da Conversão, pelo fato de realizar sacramentalmente o convite de Jesus à conversão, o caminho de volta ao Pai, do qual a pessoa se afastou pelo pecado.

g) O testemunho: O testemunho é uma questão de compromisso, fidelidade e responsabilidade. “A fé sem obras é morta” (tg 2,17). O testemunho é a melhor maneira de evangelizar.

O cristão verdadeiramente afeiçoado ao Mestre e Senhor e com Ele parecido testemunha sua vida assumindo o mandamento do amor: “Amai-vos uns aos outros, assim como eu vos amei” (Jo !5,12). Este amor vivido concretamente no dia a dia nas diferentes realidades da vida configura o cristão na característica mais autêntica de Jesus cristo e de sua Igreja, cujo testemunho de caridade fraterna será o primeiro e principal anúncio: “Todos saberão que sois meus discípulos” (Jo 13, 35). Portanto, o cristão é chamado a identificação que tem com seu Mestre e Senhor.



h) Alegria e otimismo: A alegria e o otimismo são características do cristão. O cristão é sempre esperançoso. Vive sempre alegre com a vida. É feliz! Traz sempre consigo a marca do Cristo ressuscitado. A alegria e o bom humor atraem as pessoas: “Servi ao Senhor na alegria” (Fl 4,4). A autêntica vida alegre e otimista é fruto de uma comprometida relação íntima com o Senhor ressuscitado. A raiz mais profunda da alegria messiânica esta no dom do Espírito ( at 2,46).

i) A missão: A cristão um dia ouviu o chamado de Jesus e quis segui-lo mais de perto. Resolveu ficar com Ele, andar a seu lado, ligar-se a Ele definitivamente. Como discípulo-missionário, o cristão vive a experiência do encontro com Deus de maneira livre e espontânea. É alguém que encontrou Deus em sua vida e, por isso, vive a plenitude desse encontro.

A igreja é, por natureza, essencialmente missionária. Sua missão evangelizadora, iniciada no dia de Pentecostes, foi sempre marcada por um profundo ardor missionário. A exemplo de Jesus e sua Igreja, somos chamados a nos tornar corajosos e esperançosos missionários na construção de um mundo mais humano, fraterno e solidário.



Lectio divina (leitura orante da Bíblia)

A Igreja tem recomendado a seus fiéis a “leitura orante” da Bíblia. Como uma forma que propicie ao conhecimento e uma vivência de uma espiritualidade pessoal de encontro com Deus.

A LOBB não é estudo bíblico, discussão de idéias, aquisição de conhecimentos bíblicos. Bem como não é uma leitura para depois fazer palestras, sermões para os outros. É rezar com a Bíblia para sermos discípulos de Jesus.

A LOBB é uma experiência, um exercício, uma prática, uma relação pessoal, viva, empolgante com Deus e com a realidade. Não é apenas uma técnica, um método teórico: é um caminho de transformação.

A LOBB é para dilatar o coração, abrir os olhos, estender as mãos, impulsionar os pés para a evangelização. É para mudar o coração, a vida, a sociedade. É oração que leva à ação, ao irmão, à missão, à compaixão.

É escola da Palavra de deus para o reencantamento dos discípulos, dos profetas, dos evangelizadores. É fonte de ardor apostólico.





Quatro exigências da Leitura Orante da Bíblia.



1. Ler o texto na unidade da Bíblia.

É preciso respeitar o princípio da unidade da Escritura e não tirar o texto fora do contexto, isto é, isolar o texto fora da Bíblia. Cada texto é um tijolo dentro de uma grande construção. Não se pode também ficar ao pé da letra, mas é preciso ler e interpretar o texto na vida hoje. De fato, não se trata de estudar o livro sagrado, mas sob a luz da palavra, compreender e transformar a realidade, converter-se ao Deus vivo e verdadeiro e aos irmãos.



2. Ligar o texto com a realidade

Ao ler o texto bíblico é preciso ter os olhos na vida, nos acontecimentos, nas situações concretas. A LOBB não faz de nós professores de escritura, mas transformadores da realidade. Não se pode separar a LOBB dos acontecimentos e sinais dos tempos, mas iluminar a vida com a Palavra de Deus: este é o objetivo!



3. Ler a partir da fé em Jesus Cristo

Tudo na Bíblia converge para Jesus Cristo. Ele é chave de compreensão e interpretação das Escrituras. Jesus é a última e definitiva revelação de Deus. Dizia São Jerônimo: “Ignorar as Escrituras é Ignorar Jesus Cristo”. A LOBB é uma escola bíblica para sermos discípulos de Jesus.



4. Ler o texto em comunhão com a Igreja

É preciso ler a Sagrada escritura com o coração da Igreja, em comunhão com a comunidade de fé. O leitor não é dono do texto. A Palavra de Deus foi confiada à Igreja que, por sua vez, é serva da Palavra. Assim, a LOBB deve ser feita em comunhão com a tradição, o ensino e a fé de toda a Igreja. Podemos usar os resultados dos estudos bíblicos, mas sempre em obediência à Igreja.





Preparação para prática da leitura orante



“O Senhor deu-me um ouvido de discípulo” (Is 50,4). O bom êxito de uma LOBB exige cuidados que devem ser sempre levados em consideração. Alguns são de ordem espiritual; outros de ordem psicológica ou mesmo se constituem em pormenores que podem ajudar a oração. São estes cuidados que previamente é preciso tomar:



• Escolher um texto com antecedência. Pode ser a palavra da liturgia do dia.

• Estar na graça de Deus e viver em comunhão fraterna para poder silenciar e escutar. Ter paz interior.

• Ter hora e lugar marcados. Ser fiel ao propósito.

• Tomar posição tranqüila e agradável. Cuidar da boa posição do corpo.

• Fazer um pequeno relax e acalmar-se. Fazer o ninho para oração.

• Colocar-se na presença de Deus com fé. Desejar com certeza rezar.

• Invocar as luzes do Espírito Santo.

• Ter paciência, não desistir e perseverar.

• Abrir o texto e realizar os cinco passos: Leitura; meditação; oração; contemplação e orientação para ação.





Os passos da Leitura Orante

Já é tradição entre nós, dividir a leitura orante neste passos; Ler; meditar, agradecer, contemplar, orientar para ação.

Primeiro passo: A leitura

Inicialmente é preciso ler, ler, ler... Nesta leitura precisamos:

• Conhecer, respeitar, situar o texto: leitura lenta e atenta.

• Reler, repetir, recordar de memória, relembrar em voz alta.

• Ver o que o texto diz em profundidade.

• Perceber os verbos, as palavras chaves, as idéias centrais.

• Averiguar a geografia, o contexto, as circunstancias, as passagens do texto, os personagens com suas atitudes, seus gestos, suas reações.



É preciso ler com atenção, respeito, amizade, interesse e dedicação, como se faz num encontro de amigos. Neste sentido, ler não é estudar discutir pesquisar nem aumentar conhecimentos e teorias. É, antes de tudo, acolher, escutar interiorizar a palavra.

Segundo passo: A meditação

O segundo passo é constituído pela meditação: é o momento de ruminar, mastigar, revolver na memória. Meditar é guardar no coração e deixar-se amar. É aplicar o texto em nossa vida e realidade. Isso supõe:

• Ver o que a palavra diz para mim. Procurar atualizar a palavra hoje.

• Perceber as inspirações, os apelos, os afetos, as revelações, as iluminações do texto lido.

• Relacionar com outros textos parecidos.

• Interiorizar, internalizar, ingerir a mensagem.

• Acolher outros significados do texto.

• Aplicar a palavra à realidade pessoal, comunitária, social.

• Deixar-se sensibilizar pela palavra.

• Acolher o toque da graça.



Terceiro passo: A oração

O terceiro passo consiste na oração de louvor, de agradecimento, de pedido. É o momento da resposta, do diálogo, do encontro mais pessoal do entretenimento co Deus. Isso supõe:

• Expressar os sentimentos de louvor, agradecimento, intercessão, súplicas. Abrir o coração e envolver-se na presença de Deus, acolhendo a realidade e os apelos dos irmãos.

• Fazer atos de perdão e de reconciliação.

• Rezar salmos e hinos em relação com o texto meditado.



Quarto passo: A contemplação

A contemplação, como quarto passo, nos leva a degustar a Palavra de Deus e deixar-nos envolver por ela, pela presença amorosa do pai. Isso supõe:

• Silenciar, estar quieto, descanso sob o olhar amoroso de Deus.

• Sentir-se tocado, envolvido, amado, aceito, acolhido, perdoado, pacificado.

• Permanecer na presença divina, em receptividade e atenção amorosa nos braços do Pai.

• Dar espaço para Deus, para o irmão e para a realidade da vida afetivamente.



Toda contemplação é para ser comunicada e vivida, em vista da transformação pessoal, comunitária e social. Por isso, a contemplação nos lança para o quinto e último passo: a ação.

Quinto passo: Leitura orante e vida apostólica

• A LOBB deve incendiar o coração do orante e motivá-lo para ação apostólica, para missão, para a evangelização. A Palavra de Deus nos impele à caridade e ação social, como: atenção aos pobres, acolhimento das pessoas, perdão às ofensas, partilha do pão, solidariedade.

• Pela prática da leitura orante, os cristãos se colocam à disposição para trabalhar nos projetos pastorais na comunidade em seus múltiplos ministérios: catequese, grupos de reflexão, visitação das casas, dízimo, pastoral da saúde, da criança e etc.

• Quem medita as escrituras, encontra Cristo, sua Igreja e seu Reino. Cresce na dimensão profética e social da fé, assumindo responsabilidades e trabalhos na comunidade e na sociedade.



Podemos concluir dizendo que a leitura orante move o coração e abre os olhos para o irmão, para os necessitados, para a comunidade, para implantação do Reino de Deus.



Bibliografia

CARVALHO, Humberto Robson. Espiritualidade do Catequista. São Paulo. Editora: Salesiano, 2010.

MONDINI, Danilo. Teologia da espiritualidade cristã. São Paulo. 2ª Ed. Edições: Loyola, 2002.

J. B. Libânio: Discernimento espiritual, Ed. Loyola, 1983.

CNBB: Espiritualidade presbiteral hoje, EP, 1974.

D. Helder : Renovação no Espírito e serviço do homem, EP. , 1979.